quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Poema da escritora Hilda Hilst

Poema V
Hilda Hilst
A Federico García Lorca


Companheiro, morto desassombrado, rosácea ensolarada
quem senão eu, te cantará primeiro. Quem se não eu
pontilhada de chagas, eu que tanto te amei, eu
que bebi na tua boca a fúria de umas água
seu, que mastiguei tuas conquistas e que depois chorei
porque dizias: “amor de mis entrañas, viva muerte”.
Ah! Se soubesses como ficou difícil a Poesia.
Triste garganta o nosso tempo, TRISTE TRISTE.
E mais um tempo, nem será lícito ao poeta ter memória
e cantar de repente:
“os arados van e vên
ende a Santiago a Belén”.

Os cardos, companheiro, a aspereza, o luto
a tua morte outra vez, a nossa morte, assim o mundo:
deglutindo a palavra cada vez e cada vez mais fundo.
Que dor de te saber tão morto. Alguns dirão:
Mas se está vivo, não vês? Está vivo! Se todos o celebram
Se tu cantas! ESTÁS MORTO. Sabes por quê?

“El passado se pone
su coraza de hierro
y tapa sus oídos
con algodón del viento.
Nunca podrá arrancársele
un secreto.”

E o futuro é de sangue, de aço, de vaidade. E vermelhos
azuis, braços e amarelos hão de gritar: morte aos poetas!
Morte a todos aqueles de lúcidas artérias, tatuados
de infância, de plexo aberto, exposto aos lobos. Irmão.
Companheiro. Que dor de te saber tão morto.


O poema acima foi publicado no livro "Poemas aos homens de nosso tempo”,
Ed. Globo, São Paulo - 2003, pág. 109.


Um comentário:

Anônimo disse...

julio diz: vou deixar as curiosidades aqui mesmo: a Lygia gostava de ir em casas de jogos ; em 1936seus pais se separanram

 
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